Honduras: A crise é boa, para expor nossos "democratas"
Atualizado em 23 de setembro de 2009 às 19:32 | Publicado em 23 de
setembro de 2009 às 19:21
Existem pontos positivos na cobertura que a mídia brasileira faz dos
acontecimentos em Honduras. O primeiro deles é revelar a completa
ignorância de muitos sobre a América Latina. O segundo é de iluminar o
caráter "democrático" de alguns jornalistas e políticos.
Tive o prazer de conhecer alguma coisa da América Central. Já estive
no Panamá, na Costa Rica, em El Salvador e em Honduras.
Em Honduras fiz reportagens sobre a "guerra do futebol" e sobre a
epidemia de AIDS. Fui a Tegucigalpa e a San Pedro Sula. Viajei pelo
interior. Os militares sempre tiveram papel central na política
hondurenha. Promoveram uma política de extermínio contra os
"campesinos", quando estes aderiram aos movimentos populares que em
países vizinhos resultaram em guerras civis (El Salvador e Nicarágua).
Como em outros países da região, os anos 70 e 80 em Honduras foram
marcados por rápida urbanização e por uma explosão das demandas
sociais. A imigração para os Estados Unidos funcionou como válvula de
escape. Depois que os Estados Unidos, no governo Reagan, deram forte
apoio às elites locais na suposta luta anticomunista -- na verdade,
para esmagar movimentos populares --, Washington resolveu adotar uma
política regional de pacificação econômica.
Os americanos promoveram uma área de livre comércio regional. As
maquilas se disseminaram. São as "maquiladoras", ou maquiadoras,
empresas que tiram proveito da área de livre comércio para montar
produtos que recebem vantagem tarifária para ingressar no mercado dos
Estados Unidos. Os capitais vieram da Ásia, especialmente de Taiwan e
da Coréia do Sul. Qual é o papel dos centro-americanos nessa história?
O de mão-de-obra barata. Qual é o papel das elites locais? Além de se
associar ao capital estrangeiro para enriquecer, cabe a elas garantir
que os trabalhadores não se sindicalizem e não obtenham conquistas
sociais. As condições de trabalho nas maquiladoras são pré-revolução
industrial.
A equação era essa: os homens imigravam para os Estados Unidos para
fazer o papel de derrubar o salário dos trabalhadores americanos. As
mulheres serviam às maquiladoras em condições sub-humanas.
Porém, com a crise econômica nos Estados Unidos, esse modelo ruiu.
Muitos pais de família hondurenhos perderam o emprego nos Estados
Unidos. A caça aos imigrantes promovida pelos republicanos também os
afetou. Nas economias dependentes de remessa de dólares a crise se
aprofundou. Manuel Zelaya abandonou antigos aliados em nome de romper
com esse modelo, no qual Honduras entra apenas com o trabalho servil
de seus homens e mulheres.
Portanto, não se trata apenas de dizer que Manuel Zelaya é o
presidente constitucional de Honduras, eleito pela maioria dos
eleitores e que o governo golpista é ilegítimo e ilegal. É importante
expor claramente quem são os golpistas, a quem servem: àqueles que
querem manter os hondurenhos numa servidão pré-Getúlio Vargas. Só
assim para expor a elite brasileira da maneira como ela precisa ser
exposta: como representação verde-amarela de interesses parecidos com
aqueles representados pelos afrikâners, que inventaram um sistema
sofisticado para fazer o mesmo que a elite hondurenha faz: manter
parte da população -- no caso da África do Sul, os negros; no caso de
Honduras, os "campesinos" -- na servidão.
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