quinta-feira, 19 de junho de 2008

Obama - Até onde vai a mudança?

Sempre tive a visão de que a diferença entre democratas e republicanos nos EUA era a mesma entre o filme erótico e o pornográfico. No fim das contas, os republicanos apenas faziam o sexo de maneira mais explicita...

Realmente nossas esperanças devem se depositar numa improvável (pelo menos atualmente) reorganização da classe trabalhadora nos EUA...


Na melhor tradição, Obama é um falcão
por John Pilger


Em 1941, o editor Edward Dowling escreveu: "Os dois maiores obstáculos para a democracia nos Estados Unidos são: primeiro, a ilusão generalizada entre os pobres de que temos uma democracia, e segundo, o terror crónico entre os ricos de que tenhamos uma". O que é que mudou? O terror dos ricos é maior do que nunca, e os pobres transmitiram sua ilusão àqueles que acreditam que quando George W. Bush finalmente se afastar, em Janeiro, as suas numerosas ameaças ao resto da humanidade diminuirão.

A prevista nomeação de Barack Obama, a qual, segundo um comentador ofegante, "marca um momento verdadeiramente excitante e histórico na história dos EUA", é um produto da nova ilusão. Na verdade, isto só parece novo. Momentos verdadeiramente excitantes e históricos foram fabricados em torno de campanhas presidenciais desde que eu posso lembrar, gerando o que pode apenas ser descrito como asneiradas em grande escala. Raça, género, aparência, linguagem corporal, esposas e prole, mesmo explosões de grandeza trágica, tudo isso está incluído no marketing e na "feitura de imagem", agora ampliada pela tecnologia "virtual". Graças a um sistema de colégio eleitoral não democrático (ou, no caso de Bush, de máquinas de voto amanhadas) só aqueles que tanto controlam como obedecem ao sistema podem vencer. Isto tem sido o caso desde a verdadeiramente histórica e excitante vitória de Harry Truman, o liberal democrata dito ser um humilde homem do povo, que avançou para mostrar quão duro era arrasando duas cidades com a bomba atómica.

O entendimento de Obama como um provável presidente dos Estados Unidos não é possível sem o entendimento das exigências de um sistema essencialmente de poder não alterado: com efeito, um grande jogo dos media. Por exemplo, desde que comparei Obama com Robert Kennedy nestas páginas, ele fez duas importantes declarações, mas não deixaram que as suas implicações atrapalhassem as celebrações. A primeira foi na conferência do American Israel Public Affairs Committee (Aipac), o lobby sionista, o qual, como destacou Ian Williams, "conseguirá que você seja acusado de anti-semitismo mesmo que tenha citado o sítio web da mesma para mostrar do seu poder". Obama já efectuou a sua genuflexão, mas dia 4 de Junho foi mais além. Ele prometeu apoiar uma "Jerusalém não dividida" como capital de Israel. Nem um único governo sobre a terra apoia a anexação israelense de toda a Jerusalém, incluindo o regime Bush, o qual reconhece a resolução da ONU que designa Jerusalém como cidade internacional.

A sua segunda declaração, amplamente ignorada, foi feita em Miami a 23 de Maio. Ao falar à comunidade cubana expatriada – a qual ao longo de anos produziu dedicadamente terroristas, assassinos e traficantes de drogas para administrações estado-unidenses – Obama prometeu continuar o feroz embargo a Cuba que ano após ano tem sido declarado ilegal pelas Nações Unidas.

Mais uma vez, Obama foi além de Bush. Ele disse que os Estados Unidos haviam "perdido a América Latina". Descreveu os governos democraticamente eleitos na Venezuela, Bolívia e Nicarágua como "vácuos" a serem preenchidos. Levantou a insensatez de uma influência iraniana na América Latina e apoiou "o direito da Colômbia de atacar terroristas que procuram lugares seguros além das suas fronteiras". Traduzido, isto significa o "direito" de um regime, cujo presidente e políticos principais estão ligados a esquadrões da morte, invadir seus vizinhos no interesse de Washington. Ele também apoiou a chamada Iniciativa Merida, a qual a Amnistia Internacional e outros condenaram como sendo os EUA a levar a "solução colombiana" para o México. E não parou aqui. "Devemos pressionar mais o Sul também", disse ele. Nem mesmo Bush disse isso.

Já é tempo de os racionalizadores de desejos crescerem politicamente e debaterem o mundo da grande potência tal como ela é, não como eles gostariam que fosse. Tal como todos os candidatos presidenciais sérios, no passado e no presente, Obama é um falcão e um expansionista. Ele vem de uma tradição ininterrupta do Partido Democrata, como demonstram os presidentes promotores da guerra Truman, Kennedy, Johnson, Carter e Clinton. A diferença de Obama pode ser a de que ele sinta uma necessidade ainda maior de mostrar quão duro é. Por muito que a cor da sua pele influencie tanto racistas como apoiantes, isso de qualquer forma é irrelevante para o jogo da grande potência. O "momento verdadeiramente excitante e histórico na história do EUA" só ocorrerá quando o próprio jogo for contestado.

terça-feira, 17 de junho de 2008

A história das coisas

Video muito legal, com algumas, digamos, "licenças poéticas", mas bem educativo.

Divulguem!!!!

Carta Aberta de Evo Morales

Por essas e outras que de todas as lideranças latino-americanas, o Evo é o cara que eu mais admiro...


El papel real de los migrantes
Carta abierta de Evo Morales a propósito de la "directiva retorno" de la UE

Hasta finales de la Segunda guerra mundial , Europa fue un continente de emigrantes. Decenas de millones de Europeos partieron a las Américas para colonizar, escapar de las hambrunas, las crisis financieras, las guerras o de los totalitarismos europeos y de la persecución a minorías étnicas.

Hoy, estoy siguiendo con preocupación el proceso de la llamada "directiva retorno". El texto, validado el pasado 5 de junio por los ministros del Interior de los 27 países de la Unión Europea , tiene que ser votado el 18 de junio en el Parlamento Europeo. Siento que endurece de manera drástica las condiciones de detención y expulsión a los migrantes indocumentados, cualquiera sea su tiempo de permanencia en los países europeos, su situación laboral, sus lazos familiares, su voluntad y sus logros de integración.

A los países de América Latina y Norteamérica llegaron los europeos, masivamente, sin visas ni condiciones impuestas por las autoridades. Fueron siempre bienvenidos, Y. lo siguen siendo, en nuestros países del continente americano, que absorbieron entonces la miseria económica europea y sus crisis políticas. Vinieron a nuestro continente a explotar riquezas y a transferirlas s Europa, con un altísimo costo para las poblaciones originales de América. Como en el caso de nuestro Cerro Rico de Potosí y sus fabulosas minas de plata que permitieron dar masa monetaria al continente europeo desde el siglo XVI hasta el XIX. Las personas, los bienes y los derechos de los migrantes europeos siempre fueron respetados.

Hoy, la Unión Europea es el principal destino de los migrantes del mundo lo cual es consecuencia de su positiva imagen de espacio de prosperidad y de libertades públicas. La inmensa mayoría de los migrantes viene a la UE para contribuir a esta prosperidad, no para aprovecharse de ella. Ocupan los empleos de obras públicas, construcción, en los servicios a la persona y hospitales, que no pueden o no quieren ocupar los europeos. Contribuyen al dinamismo demográfico del continente europeo, a mantener la relación entre activos e inactivos que vuelve posible sus generosos sistemas de seguridad social y dinamizan el mercado interno y la cohesión social. Los migrantes ofrecen una solución a los problemas demográficos y financieros de la UE.

Para nosotros, nuestros migrantes representan la ayuda al desarrollo que los Europeos no nos dan - ya que pocos países alcanzan realmente el mínimo objetivo del 0,7% de su PIB en la ayuda al desarrollo. América Latina recibió, en 2006, 68.000 millones de dólares de remesas, o sea más que el total de las inversiones extranjeras en nuestros países. A nivel mundial alcanzan 300.000 millones de dólares, que superan a los 104.000 millones otorgados por concepto de ayuda al desarrollo. Mi propio país, Bolivia, recibió mas del 10% del PIB en remesas (1.100 millones de dólares) o un tercio de nuestras exportaciones anuales de gas natural.

Es decir que los flujos de migración son benéficos tanto para los Europeos y de manera marginal para nosotros del Tercer Mundo ya que también perdemos a contingentes que suman millones de nuestra mano de obra calificada, en la que de una manera u otra nuestros Estados, aunque pobres, han invertido recursos humanos y financieros.

Lamentablemente, el proyecto de "directiva retorno" complica terriblemente esta realidad. Si concebimos que cada Estado o grupo de Estados puede definir sus políticas migratorias en toda soberanía, no podemos aceptar que los derechos fundamentales de las personas sean denegados a nuestros compatriotas y hermanos latinoamericanos. La "directiva retorno" prevé la posibilidad de un encarcelamiento de los migrantes indocumentados hasta 18 meses antes de su expulsión -o "alejamiento", según el término de la directiva. ¡18 meses! ¡Sin juicio ni justicia! Tal como esta hoy el proyecto de texto de la directiva viola claramente los artículos 2, 3, 5, 6, 7, 8 y 9 de la Declaración Universal de los Derechos Humanos de 1948. En particular el artículo 13 de la Declaración reza:
"1. Toda persona tiene derecho a circular libremente y a elegir su residencia en el territorio de un Estado.
2. Toda persona tiene derecho a salir de cualquier país, incluso del propio, y a regresar a su país".

Y, lo peor de todo, existe la posibilidad de encarcelar a madres de familia y menores de edad, sin tomar en cuenta su situación familiar o escolar, en estos centros de internamientos donde sabemos ocurren depresiones, huelgas de hambre, suicidios. ¿Cómo podemos aceptar sin reaccionar que sean concentrados en campos compatriotas y hermanos latinoamericanos indocumentados, de los cuales la inmensa mayoría lleva años trabajando e integrándose? ¿De qué lado esta hoy el deber de ingerencia humanitaria? ¿Dónde está la "libertad de circular", la protección contra encarcelamientos arbitrarios?

Paralelamente, la Unión Europea trata de convencer a la Comunidad Andina de Naciones (Bolivia, Colombia, Ecuador y Perú) de firmar un "Acuerdo de Asociación" que incluye en su tercer pilar un Tratado de Libre Comercio, de misma naturaleza y contenido que los que imponen los Estados Unidos. Estamos bajo intensa presión de la Comisión Europea para aceptar condiciones de profunda liberalización para el comercio, los servicios financieros, propiedad intelectual o nuestros servicios públicos. Además a título de la protección jurídica se nos presiona por el proceso de nacionalización del agua, el gas y telecomunicaciones realizados en el Día Mundial de los Trabajadores. Pregunto, en ese caso ¿dónde está la "seguridad jurídica" para nuestras mujeres, adolescentes, niños y trabajadores que buscan mejores horizontes en Europa?

Promover la libertad de circulación de mercancías y finanzas, mientras en frente vemos encarcelamiento sin juicio para nuestros hermanos que trataron de circular libremente. Eso es negar los fundamentos de la libertad y de los derechos democráticos.
Bajo estas condiciones, de aprobarse esta "directiva retorno", estaríamos en la imposibilidad ética de profundizar las negociaciones con la Unión Europea , y nos reservamos del derecho de normar con los ciudadanos europeos las mismas obligaciones de visa que nos imponen a los Bolivianos desde el primero de abril de 2007, según el principio diplomático de reciprocidad. No lo hemos ejercido hasta ahora, justamente por esperar buenas señales de la UE.

El mundo, sus continentes, sus océanos y sus polos conocen importantes dificultades globales: el calentamiento global, la contaminación, la desaparición lenta pero segura de recursos energéticos y biodiversidad mientras aumenta el hambre y la pobreza en todos los países, fragilizando nuestras sociedades. Hacer de los migrantes, que sean documentados o no, los chivos expiatorios de estos problemas globales, no es ninguna solución. No corresponde a ninguna realidad. Los problemas de cohesión social que sufre Europa no son culpa de los migrantes, sino el resultado del modelo de desarrollo impuesto por el Norte, que destruye el planeta y desmiembra las sociedades de los hombres.

A nombre del pueblo de Bolivia, de todos mis hermanos del continente regiones del mundo como el Maghreb, Asia y los países de Africa, hago un llamado a la conciencia de los líderes y diputados europeos, de los pueblos, ciudadanos y activistas de Europa, para que no se apruebe e1 texto de la "directiva retorno".

Tal cual la conocemos hoy, es una directiva de la vergüenza. Llamo también a la Unión Europea a elaborar, en los próximos meses, una política migratoria respetuosa de los derechos humanos, que permita mantener este dinamismo provechoso para ambos continentes y que repare de una vez por todas la tremenda deuda histórica, económica y ecológica que tienen los países de Europa con gran parte del Tercer Mundo, que cierre de una vez las venas todavía abiertas de América Latina. No pueden fallar hoy en sus "políticas de integración" como han fracasado con su supuesta "misión civilizatoria" del tiempo de las colonias.

Reciban todos ustedes, autoridades, europarlamentarios, compañeras y compañeros saludos fraternales desde Bolivia. Y en particular nuestra solidaridad a todos los "clandestinos".

Evo Morales Ayma
Presidente de la República de Bolivia

segunda-feira, 16 de junho de 2008

A natureza não é muda - Eduardo Galeano

O Equador está discutindo uma nova Constituição. Entre as propostas, abre-se a possibilidade de reconhecer, pela primeira vez na história, os direitos da natureza. Parece loucura querer que a natureza tenha direitos. Em compensação, parece normal que as grandes empresas dos EUA desfrutem de direitos humanos, conforme foi aprovado pela Suprema Corte, em 1886.

Eduardo Galeano - Brecha

O mundo pinta naturezas mortas, sucumbem os bosques naturais, derretem os pólos, o ar torna-se irrespirável e a água imprestável, plastificam-se as flores e a comida, e o céu e a terra ficam completamente loucos.

E, enquanto tudo isto acontece, um país latino-americano, o Equador, está discutindo uma nova Constituição. E nessa Constituição abre-se a possibilidade de reconhecer, pela primeira vez na história universal, os direitos da natureza.

A natureza tem muito a dizer, e já vai sendo hora de que nós, seus filhos, paremos de nos fingir de surdos. E talvez até Deus escute o chamado que soa saindo deste país andino, e acrescente o décimo primeiro mandamento, que ele esqueceu nas instruções que nos deu lá do monte Sinai: "Amarás a natureza, da qual fazes parte".

Um objeto que quer ser sujeito
Durante milhares de anos, quase todo o mundo teve direito de não ter direitos.

Nos fatos, não são poucos os que continuam sem direitos, mas pelo menos se reconhece, agora, o direito a tê-los; e isso é bastante mais do que um gesto de caridade dos senhores do mundo para consolo dos seus servos.

E a natureza? De certo modo, pode-se dizer que os direitos humanos abrangem a natureza, porque ela não é um cartão postal para ser olhado desde fora; mas bem sabe a natureza que até as melhores leis humanas tratam-na como objeto de propriedade, e nunca como sujeito de direito.

Reduzida a uma mera fonte de recursos naturais e bons negócios, ela pode ser legalmente maltratada, e até exterminada, sem que suas queixas sejam escutadas e sem que as normas jurídicas impeçam a impunidade dos criminosos. No máximo, no melhor dos casos, são as vítimas humanas que podem exigir uma indenização mais ou menos simbólica, e isso sempre depois que o mal já foi feito, mas as leis não evitam nem detêm os atentados contra a terra, a água ou o ar.

Parece estranho, não é? Isto de que a natureza tenha direitos... Uma loucura. Como se a natureza fosse pessoa! Em compensação, parece muito normal que as grandes empresas dos Estados Unidos desfrutem de direitos humanos. Em 1886, a Suprema Corte dos Estados Unidos, modelo da justiça universal, estendeu os direitos humanos às corporações privadas. A lei reconheceu para elas os mesmos direitos das pessoas: direito à vida, à livre expressão, à privacidade e a todo o resto, como se as empresas respirassem. Mais de 120 anos já se passaram e assim continua sendo. Ninguém fica estranhado com isso.

Gritos e sussurros
Nada há de estranho, nem de anormal, o projeto que quer incorporar os direitos da natureza à nova Constituição do Equador.

Este país sofreu numerosas devastações ao longo da sua história. Para citar apenas um exemplo, durante mais de um quarto de século, até 1992, a empresa petroleira Texaco vomitou impunemente 18 bilhões de galões de veneno sobre terras, rios e pessoas. Uma vez cumprida esta obra de beneficência na Amazônia equatoriana, a empresa nascida no Texas celebrou seu casamento com a Standard Oil. Nessa época, a Standard Oil, de Rockefeller, havia passado a se chamar Chevron e era dirigida por Condoleezza Rice. Depois, um oleoduto transportou Condoleezza até a Casa Branca, enquanto a família Chevron-Texaco continuava contaminando o mundo.

Mas as feridas abertas no corpo do Equador pela Texaco e outras empresas não são a única fonte de inspiração desta grande novidade jurídica que se tenta levar adiante. Além disso, e não é o menos importante, a reivindicação da natureza faz parte de um processo de recuperação das mais antigas tradições do Equador e de toda a América. Visa a que o Estado reconheça e garanta o direito de manter e regenerar os ciclos vitais naturais, e não é por acaso que a Assembléia Constituinte começou por identificar seus objetivos de renascimento nacional com o ideal de vida do sumak kausai. Isso significa, em língua quechua, vida harmoniosa: harmonia entre nós e harmonia com a natureza, que nos gera, nos alimenta e nos abriga e que tem vida própria, e valores próprios, para além de nós.

Essas tradições continuam miraculosamente vivas, apesar da pesada herança do racismo, que no Equador, como em toda a América, continua mutilando a realidade e a memória. E não são patrimônio apenas da sua numerosa população indígena, que soube perpetuá-las ao longo de cinco séculos de proibição e desprezo. Pertencem a todo o país, e ao mundo inteiro, estas vozes do passado que ajudam a adivinhar outro futuro possível.

Desde que a espada e a cruz desembarcaram em terras americanas, a conquista européia castigou a adoração da natureza, que era pecado de idolatria, com penas de açoite, forca ou fogo. A comunhão entre a natureza e o povo, costume pagão, foi abolida em nome de Deus e depois em nome da civilização. Em toda a América, e no mundo, continuamos pagando as conseqüências desse divorcio obrigatório.

Publicado originalmente no semanário Brecha, do Uruguai.